Leituras para distrair
O atendente serve a cachaça usando um dosador, mas deixa que
o líquido transborde por alguns segundos, o volume servido é maior que a
dosagem prescrita. Em outras situações o próprio copo faz o papel de dosador,
não há como transbordar, então o atendente serve uma porção bem menor que o
volume do copo, espera que o cliente beba, e reinicia o enchimento do copo
desconsiderando a porção servida inicialmente. Há casos de inversão no
procedimento, o copo é cheio totalmente, o cliente beberica uma pequena porção
e o atendente volta a servir, completando o volume que foi consumido.
São práticas comuns no serviço de alguns destilados,
particularmente no serviço da cachaça, meu interesse, e tais práticas que são
costumeiras na região do Rio de Janeiro recebem o nome de CHORO.
Em alguns estabelecimentos isso não é possível porque sobre a
garrafa é aplicada uma fita que marca as dosagens pela altura do líquido o que
impede o procedimento. Mas, isso é típico no serviço do uísque, não é muito
comum no caso da cachaça. Ao contrário, é mais comum que o atendente, quando o
copo permite, sirva doses generosas a seu próprio arbítrio. A meu juízo isso é um sinal que fala mais sobre a
desqualificação da bebida pelo próprio atendente do que sobre a sua
generosidade para com o cliente.
Já vi essas práticas em outras regiões, até fora do país, e não sei afirmar se o choro é
uma prática generalizada, nem conheço outros termos. Mas, o meu universo são os
botecos que frequento, e entre uma dose e outra eu relaxo imaginando sobre qual
terá sido a origem da prática do choro e porque “choro”?
Naturalmente estou falando de divagações alcoólicas, nada a
ver com análises antropológicas, mas lembro que certas teses apontam práticas e
hábitos culturais como decorrentes de necessidades de organização social que
foram sedimentadas pelo tempo. Sob essa óptica, quais teriam sido as raízes e
motivações da prática e designação do “choro”?
O termo decorreria da relação de sinônimos entre os verbos
chorar e apelar? Chorar por mais bebida? Sempre achei essa interpretação muito óbvia,
mas, ainda assim, compartilho minhas especulações e paro por aqui, sem choro.
### (Jorge Santos – Rio, 25/04/2024)