segunda-feira, 22 de julho de 2013

As espiadelas do Obama

Opinião

A espionagem americana tornada manchete internacional, menos pela revelação de um fato que nem era secreto, e mais pelas circunstâncias que cercaram a sua divulgação – as delações do ex-técnico da CIA, Edward Snowden, trouxe para o centro das manchetes, mas não para o centro dos debates,  a questão da regulamentação da internet e assuntos afins.

Os noticiários abordam a questão conforme os interesses de suas redações e os pontos de vista de seus articulistas valorizando e personalizando as reações diplomáticas e oficiais, via de regra com observações medíocres. Assim, o tratamento da questão fica subordinado às manchetes que escondem aspectos relevantes e que precisariam ser debatidos nesta oportunidade, entre eles a importância estratégica do setor ou dos sistemas de Telecomunicações do país.

Não há “mundo virtual” nem “redes” de informação sem infraestrutura física de Telecom. É um fato que o estado da arte da tecnologia viabiliza cada vez mais a gerência centralizada dessa infraestrutura, assim como a redução da demanda de recursos humanos para a garantia da sua continuidade. Porém, não tenhamos dúvidas, os impérios informacionais que se impuseram no espaço de tempo menor que um século existem e existirão na medida em que controlarem os sistemas de Telecom que lhes servem de meio e suporte.

Com esta visão, é muito ruim que o poder Executivo, bem como os parlamentares, mesmo alguns que adquiriram poder de representação política nas lutas contra a privatização do setor e suas empresas, tratem a questão das Telecom como apenas um ramo de negócios, sem considerar o setor como estratégico para qualquer política pública que se queira desenvolver.

Recentemente, o jornalista Elio Gaspari escreveu um artigo na Folha de São Paulo sobre a espionagem americana. Embora eu não concorde com os termos em que o jornalista tratou o assunto, em seu artigo há um trecho que ressalto “... Pode-se negociar o compartilhamento de informações ou mesmo criar barreiras sempre vulneráveis, mas o governo brasileiro não fez o bê-á-bá, pois nem satélite próprio tem...”[i].

Talvez o próprio jornalista não tenha valorizado o trecho que ressaltei, na medida em se concentrou em tentar ridicularizar a Dilma e as suas ações, mas neste aspecto ele tem razão. O Estado brasileiro não tem satélite próprio para fazer nada. Também não tem um sistema de Telecom porque o governo FHC vendeu tudo, e os governos Lula e Dilma nada fizeram para mudar o quadro e nem incluíram este assunto como pauta prioritária em seus governos.

Obviamente seria ingenuidade pensar que o país teria recursos tecnológicos suficientes para se confrontar com o império americano e suas garras, mas a questão é que neste aspecto o país ficou de calça nas mãos e com a bunda na janela, sem fazer nada, nem mesmo sair da janela e tentar se vestir em cuecas, calcinhas, fraldas  ou cueiros protegendo aquilo que a sílaba inicial da palavra cueiro sugere.

O governo não dispõe, nem mesmo de uma rede de comunicações fechada, de interesse estatal, sem acesso público.

A Rede Nacional de Pesquisas – RNP (cuja direção no governo FHC e nos primórdios da internet no Brasil embalou-se num falso conflito com a Embratel e o monopólio ainda estatal), está aí consumindo uma grana de respeito para alugar canais de Telecom de operadoras privadas e sem conseguir sequer  interligar as universidades do país com uma internet que preste[ii].

É possível que o assunto seja esquecido em alguns dias. Tomara que não. Seria bom que ele permanecesse em pauta, mesmo que motivado pelas preocupações daquelas corporações econômicas multinacionais que sentiram alguma insegurança com as espiadelas indiscretas do Obama, como parece estar acontecendo.

Tomara que o assunto fique em pauta o tempo suficiente para que se crie alguma agitação interna forçando a discussão e deliberação, quem sabe, de algumas ações positivas.



[i] A patriotada do grampo – Folha de São Paulo – Acessado em 10/07/2013



Nenhum comentário:

Postar um comentário