Opinião
A espionagem americana
tornada manchete internacional, menos pela revelação de um fato que nem era secreto,
e mais pelas circunstâncias que cercaram a sua divulgação – as delações do
ex-técnico da CIA, Edward Snowden, trouxe para o centro das manchetes, mas não
para o centro dos debates, a questão da
regulamentação da internet e assuntos afins.
Os noticiários abordam a
questão conforme os interesses de suas redações e os pontos de vista de seus
articulistas valorizando e personalizando as reações diplomáticas e oficiais,
via de regra com observações medíocres. Assim, o tratamento da questão fica
subordinado às manchetes que escondem aspectos relevantes e que precisariam ser
debatidos nesta oportunidade, entre eles a importância estratégica do setor ou
dos sistemas de Telecomunicações do país.
Não há “mundo virtual” nem
“redes” de informação sem infraestrutura física de Telecom. É um fato que o
estado da arte da tecnologia viabiliza cada vez mais a gerência centralizada
dessa infraestrutura, assim como a redução da demanda de recursos humanos para
a garantia da sua continuidade. Porém, não tenhamos dúvidas, os impérios
informacionais que se impuseram no espaço de tempo menor que um século existem
e existirão na medida em que controlarem os sistemas de Telecom que lhes servem
de meio e suporte.
Com esta visão, é muito ruim
que o poder Executivo, bem como os parlamentares, mesmo alguns que adquiriram
poder de representação política nas lutas contra a privatização do setor e suas
empresas, tratem a questão das Telecom como apenas um ramo de negócios, sem
considerar o setor como estratégico para qualquer política pública que se
queira desenvolver.
Recentemente, o jornalista
Elio Gaspari escreveu um artigo na Folha de São Paulo sobre a espionagem
americana. Embora eu não concorde com os termos em que o jornalista tratou o
assunto, em seu artigo há um trecho que ressalto “... Pode-se negociar o
compartilhamento de informações ou mesmo criar barreiras sempre vulneráveis,
mas o governo brasileiro não fez o bê-á-bá, pois nem satélite próprio tem...”[i].
Talvez o próprio jornalista não
tenha valorizado o trecho que ressaltei, na medida em se concentrou em tentar
ridicularizar a Dilma e as suas ações, mas neste aspecto ele tem razão. O
Estado brasileiro não tem satélite próprio para fazer nada. Também não tem um sistema
de Telecom porque o governo FHC vendeu tudo, e os governos Lula e Dilma nada
fizeram para mudar o quadro e nem incluíram este assunto como pauta prioritária
em seus governos.
Obviamente seria ingenuidade
pensar que o país teria recursos tecnológicos suficientes para se confrontar
com o império americano e suas garras, mas a questão é que neste aspecto o país
ficou de calça nas mãos e com a bunda na janela, sem fazer nada, nem mesmo sair
da janela e tentar se vestir em cuecas, calcinhas, fraldas ou cueiros protegendo aquilo que a sílaba
inicial da palavra cueiro sugere.
O governo não dispõe, nem
mesmo de uma rede de comunicações fechada, de interesse estatal, sem acesso
público.
A Rede Nacional de Pesquisas
– RNP (cuja direção no governo FHC e nos primórdios da internet no Brasil embalou-se
num falso conflito com a Embratel e o monopólio ainda estatal), está aí consumindo
uma grana de respeito para alugar canais de Telecom de operadoras privadas e
sem conseguir sequer interligar as
universidades do país com uma internet que preste[ii].
É possível que o assunto seja
esquecido em alguns dias. Tomara que não. Seria bom que ele permanecesse em
pauta, mesmo que motivado pelas preocupações daquelas corporações econômicas multinacionais
que sentiram alguma insegurança com as espiadelas indiscretas do Obama, como
parece estar acontecendo.
Tomara que o assunto fique
em pauta o tempo suficiente para que se crie alguma agitação interna forçando a
discussão e deliberação, quem sabe, de algumas ações positivas.
[i] A patriotada do grampo – Folha de São Paulo – Acessado em 10/07/2013
[ii] RNP não consegue levar alta velocidade às universidades do interior, por falta de infra das teles. – Plantão Telesíntese – Acessado em 10/07/2013
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