Crônicas de militante
O
dia foi de nervosismo e ansiedade. Esperávamos a votação da “nossa” emenda de
anistia, mas ela não aconteceu. Votou-se a anistia para os militares, centenas
deles punidos por atos administrativos do golpe de 64 e que não foram
contemplados pela Lei da Anistia de 1979. Um desastre. Todas as emendas
rejeitadas. Felizmente a sessão Constituinte foi encerrada e a votação da
“nossa” emenda, a da anistia para os servidores públicos e de empresas estatais
ficou para o dia seguinte, 15 de junho de 1988.
Aguardamos
ansiosos e articulando. Nossa indefinição maior passava por ter alguém que
defendesse a emenda junto aos parlamentares e partidos da direita, um
constituinte conservador. Nosso alvo era o senador Jarbas Passarinho. Ex-governador
biônico do Pará, ex-ministro do Trabalho e da Educação nos governos militares, signatário
do AI 5 – mais à direita era impossível. Constava que ele tinha uma simpatia
pela emenda decorrente de uma história sobre
um irmão, servidor público, que teria sido injustiçado em outros tempos. Ele apregoava
ser um democrata, defensor do direito de greve. Em nossas visitas de
convencimento não identificamos hostilidades explicitas. Investimos bastante
para que ele defendesse a “nossa” proposta de emenda, realizamos várias
abordagens, mas sem um compromisso final
.
No
dia seguinte as galerias estavam cheias e havia trabalhadores de diversos
estados do Brasil, muitos deles uniformizados. Ainda ocorreram votações sobre a
anistia dos militares e todas foram derrotadas. Nós fazíamos pressão máxima
junto aos parlamentares, quase invadíamos o plenário. O patrono da “nossa”
emenda, João Paulo do PT – MG, estava no limite de suas possibilidades de
articulação e, a esta altura, o deputado Lula já estava envolvido, afinal a anistia
era a “bola da vez”. E foi Lula quem assumiu,
no ambiente do plenário, onde não podíamos entrar, a intermediação das
conversas com o senador Passarinho.
Lula
ia lá e vinha cá. Sabia o que a emenda representava para uma parcela aguerrida da
militância, não só do seu partido, mas de todos os partidos de esquerda. Nos
momentos finais uma condição: reivindicávamos a “reintegração”, Passarinho
faria a defesa se fosse “readmissão”, isto é, não teríamos direito aos salários
do tempo que ficamos fora. A decisão precisava ser tomada. Um pequeno comitê e
concordamos. Voltar para a empresa era a prioridade. Um aceno de concordância para
o Lula, um cochicho entre o Lula e o Passarinho, outros cochichos com o
presidente da mesa, Ulisses Guimarães, e este encaminhou para a votação a
proposta de fusão das emendas dos deputados:Hélio Duque (PMDB/PR), João Paulo (PT/MG) e Carlos Cardinal (PDT – RS), a “nossa” emenda.
O
deputado Michel Temer defendeu a aprovação pelo PMDB e o senador Jarbas
Passarinho discursou defendendo a aprovação pelo seu partido, o PDS. A turma da
direita o acompanhou. Fizemos tanta agitação que o próprio Ulysses alertou para
não comprometermos um resultado favorável. O plenário da Constituinte estava cheio
de balões de aniversário impressos com a palavra “anistia” que mandamos fazer
e que arremessamos das galerias. Os constituintes brincavam com os balões que flutuavam entre
eles. Ulisses Guimarães proclamou a aprovação da proposta: Sim: 406; Não: 8; Abstenção: 9; Total:
423.
Nas
galerias éramos só orgulho e emoção. Vibramos e choramos. Gritamos nossas
palavras de ordem. Queríamos comemorar ali e, ao mesmo tempo, regressar e
abraçar os colegas na empresa. Em
Brasília foi uma noite de festa. Víamos uns nos outros a responsabilidade por
aquela vitória. Na sede da Embratel, no dia seguinte, a comemoração ocupou uma
pista Av. Pres. Vargas. Marcamos a nossa luta na Constituição de 88. O
monopólio estatal das Telecom e a Anistia dos grevistas. Almas lavadas. Almas
de todos. Não eram pequenas.
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Muito emocionante relembrar esses tempos e essas lutas. Um abraço, Jorge. Claudio (ex-AEBT/RJ).
ResponderExcluirTenho a certeza de que foi um belo trabalho, em muitos momentos passamos privações e até dificuldade de se manter em Brasília, mas aquela noite é uma das coisas que não sai da minha memória, eu fiquei na comissão aguardando a votação, escutando pelo sistema de som a votação, e depois aguardando o retorno de todos, o abraço conjunto ao deputado João Paulo e finalmente o abraço e a choradeira conjunta...
ResponderExcluire a luta continua!
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