sexta-feira, 19 de junho de 2015

Oceano Atlântico

Vizinhos

Ele complementa a magnífica visão de outro vizinho, o Aterro do Flamengo, e eu deveria tratá-lo por “baía de Guanabara”, mas um fato cômico determinou a minha escolha. Logo que vim para a moradia atual solicitei a transferência da minha linha telefônica fixa. A atendente da operadora, que devia estar num Call Center em qualquer lugar do Brasil diferente do Rio de Janeiro, insistia para que eu complementasse o meu endereço (praia do Flamengo) com alguma outra referência, apesar de eu já ter informado número do prédio, apto, bairro, CEP etc. Aporrinhado e de saco cheio, sugeri que ela anotasse Oceano Atlântico, afinal a praia do Flamengo pertence ao mesmo. A sugestão provocou um silêncio no outro lado da linha que eu deduzi decorrer da irritação da atendente enquanto contava até dez para não mandar às favas eu e a minha ironia. Passado o silêncio, ela completou o registro da solicitação sem mais delongas. Porém, a minha surpresa foi enorme quando recebi a conta telefônica e verifiquei que, como referência para o meu endereço, estava impresso “Oceano Atlântico”. E tem sido assim, todos os meses, há anos, acreditem, ou não. A minha conta telefônica deve ter pequena possibilidade de ser extraviada para qualquer um dos outros três oceanos do planeta porque nela consta como referência para o endereço praia do Flamengo, no Rio de Janeiro: Oceano Atlântico, e foi daí que eu resolvi dar este tratamento ao meu vizinho, em vez de tratá-lo como “baía de Guanabara”.


Oceano Atlântico ou baía de Guanabara, o fato é que desfruto o privilegio dessa vizinhança. Da janela contemplo aqui, em margem próxima, desde o aeroporto Santos Dumont, a marina da Gloria, a praia do Flamengo, até os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar. Acolá, o litoral da distante Niterói, desde a Ponte, passando por suas praias urbanas até a histórica fortaleza de Santa Cruz marca da consolidação do poder imperial português. Entre as margens daqui e de lá o curiosíssimo forte Tamandaré, na ilha da Laje, que parece uma enorme tartaruga encravada no meio da baía de Guanabara e vigiando a sua entrada. O sobe e desce dos aviões passa a impressão de suaves voos panorâmicos, e a incessante movimentação das embarcações de grande porte parece um desfile ensaiado onde os veleiros e outras pequenas embarcações realizam uma espécie de dança de vai e vem. Arrisco dizer que é uma das mais belas paisagens do Rio de Janeiro. Não importa o horário ou as condições climáticas, as visões são sempre espetaculares e surpreendentes.

Gosto de imaginar os primeiros navegadores tentando identificar o que parecia ser a desembocadura de um grande rio. Penso nas disputas entre portugueses e seus desafetos lutando pela posse destes territórios, cagando e andando para os nativos obrigados a incluir entre as suas próprias disputas aqueles novos e estranhos seres. Mas, gosto também de pensar que um dia João Cândido e seus companheiros ocuparam essa paisagem comandando as embarcações capturadas em sua revolta e subjugando com os seus canhões o poder republicano e obrigando-o a abolir as punições com na marinha com o uso da chibata. Caramba! Esse vizinho tem muita historia pra contar.


Oceano Atlântico e Aterro - Visão da janela
Clique aqui para uma melhor visão da imagem




Minha conta telefônica com endereço e... referência



4 comentários :

  1. Sensacional, Jorge!
    Devidamente fofocado!
    Abraços
    Pablo

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  2. quero um Oceano Atlântico na minha conta de luz.

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  3. Não canso de ouvir essa história, agora posso ler a crônica. Muito bom

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  4. Jorge, relendo a crônica, a questão: 4 anos depois, ainda continua essa menção? Mesmo com conta digital? Abração

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