segunda-feira, 13 de julho de 2015

UNE

Vizinhos

Esta vizinha é uma velha senhora caminhando para os seus oitenta anos. A União Nacional dos Estudantes – UNE é vizinha de calçada, e a sua sede, no número 132 da Praia do Flamengo, está precisamente a 240 metros além da portaria do meu prédio. A rigor, ela “estava” porque, no momento, o local é um canteiro de obras. Naquele endereço funcionou, nos anos 30, o clube Sociedade Germânia fundado antes da independência do Brasil. O clube foi fechado durante a segunda grande guerra pelo governo Vargas que confiscou e concedeu o prédio aos estudantes para ser a sede da UNE que já existia desde 1937. Atualmente o clube Germânia funciona na Gávea.

A UNE foi símbolo das manifestações estudantis que contestaram o regime militar, e por isto foi declarada ilegal em 1964. Seu prédio sede foi incendiado nos primeiros dias do golpe e, mais tarde, demolido pela ditadura. A entidade passou a atuar na clandestinidade, seus militantes e dirigentes foram perseguidos e alguns deles presos ou assassinados. Em 2007 os estudantes ocuparam o terreno que funcionava como um estacionamento e conseguiram na Justiça a posse do mesmo. Mais tarde o Congresso Nacional reconheceu a responsabilidade do Estado e determinou a indenização da UNE por suas perdas. Em 2010 o presidente Lula inaugurou no local o início das obras de reconstrução da sede da UNE. Conforme tem sido divulgado por alguns jornais e, em parte, pela própria UNE, na área de sua sede será erguida a “Torre Flamengo” uma obra realizada em sociedade com a iniciativa privada. Será um prédio de 12 andares que abrigará a nova sede com um espaço para o seu uso exclusivo, mas que também será um empreendimento para a exploração comercial.

Neste momento, junho de 2015, a minha vizinha está realizando o seu 54º Congresso em Goiânia (GO). Sem dúvida um evento importante que registra cerca de 10 mil participantes. Entretanto, a UNE tem sido contestada como a representante unânime da esquerda política na área estudantil, e acusada de imobilismo decorrente de seu apoio incondicional ao  governo federal. Seus críticos criaram, em 2009, uma nova entidade a “ANEL - Assembleia Nacional dos Estudantes – Livre” que já realiza o seu terceiro congresso no mesmo período do congresso da UNE, mas em Campinas (SP) e com cerca de 1000 participantes. O futuro nos dirá sobre os desdobramentos destas disputas.

Enquanto isto, a vizinha segue com suas obras. As placas no local já não fazem menção à entidade, mas uma animação no youtube informa que ali haverá auditório, sala de exposição, café, restaurante, garagem em subsolo e outros recursos decorrentes de um projeto que foi doado à UNE pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Eu preferiria uma UNE não “empreendedora”, praticando a sua liberdade nas ruas, provocando a participação política dos estudantes. Leve como eles,  e sem essa coisa de administração comercial de patrimônio que me parece um convite à acomodação e ao peleguismo. As notícias falam em uma obra de custo R$ 65 milhões – não é pouca coisa. Parece que a velha senhora reaparecerá em grande estilo, pelo menos, ressalve-se, na aparência.

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Canteiro de obras - sede da UNE, Praia do Flamengo, 132
Cartazes anteriores ao início das obras


Canteiro de obras - As referências à UNE foram retiradas

Sede da UNE logo após o confisco da sede do Germânia (esquerda) e
incêndio durante o golpe militar de 1964 (direita)

Ruínas da antiga Sede








Torre Flamengo
Local da nova sede da UNE



Esses corôas são ex-presidentes da UNE
Manifestação quando o terreno foi devolvido à entidade



ANEL- Assembléia Nacional dos Estudantes  Livre
Nova entidade - Oposição à UNE

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