terça-feira, 4 de julho de 2017

Viver da fé, mas fé em que?

Opinião

A nossa greve de 30 de junho de 2017, que deveria ser geral, teve uma boa mobilização e manifestações importantes em todo o país, mas foi bem aquém da que precisamos e que podemos realizar. E as dificuldades nem foram inesperadas, por um lado o boicote dos meios de comunicação e a violência da repressão e, por outro, a causa principal, a falta de entrosamento entre as principais centrais sindicais e o imobilismo de algumas direções, notadamente da Força Sindical e da UGT, mas também da CUT.[1] Ainda bem que essas posturas não refletem o ânimo da militância que quis e quer a Greve Geral. Mas, o caminho está apontado com uma clareza talvez nunca vista, precisamos de uma revolução, embora essa meta ainda careça de apoio. Assim, até chegar lá, devemos combater a classe dominante contestando as suas regras e lutando por uma ordem política que valorize a participação direta da população no poder, bem como por mecanismos diversos de distribuição da riqueza.

Vivemos um cenário contraditório. Salvo raras exceções, as atuais instituições políticas estão corrompidas, e seus principais representantes já não tem qualquer constrangimento em demonstrar os seus comprometimentos. Ainda assim, o grosso da nossa população, apesar de atônita e sem perspectivas, segue atendendo aos ditames de uma degradada ordem institucional e cumprindo as suas obrigações sociais. Praticamos em escala nacional o mesmo comportamento sintetizado nos versos do grupo musical Paralamas do Sucesso, a propósito das favelas de Salvador, Jamaica e Rio de Janeiro. Praticamos uma arte de viver da fé, mas sem saber fé em que.[2]

Há um extrato da população que alcançou o patamar de classe media e que também não está satisfeito. Porém, parte expressiva desse extrato temendo a perda de seus parcos privilégios ela não arrisca passo. Extravasa as suas insatisfações discursando que “todos são ladrões”, mas não vai além disso, ao contrário, censura quem se atreve. Imagina-se como um grupo especial que teve o azar de nascer nesse país “zinho de merda”, e suas propostas de transformações são, invariavelmente, de cunho fascista e retrógrado. Resgataram até os embolorados discursos anticomunistas, e o seu pavor é tanto que estão no limiar de reavivarem os antigos comandos de caça (CCC). Ela não gosta de ser vista assim, mas seu real papel defender o status quo fazendo-se de cão de guarda das verdadeiras elites.

Nesse  cenário cresce a barbárie. Tanto a barbárie institucional promovida pela elite rentista e empresarial, organizada através dos seus representantes parlamentares, na tentativa de aprovar as reformas trabalhista e da previdência, como a barbárie marginal não organizada que marca os seus domínios e estabelece as suas regras através da violência armada contra a população em geral, incluindo a assombrada classe média.

As citações dos poetas do Paralamas sobre os moradores de Alagados, Trenchtown e Favela da Maré hoje valem para todos, mas principalmente para nós que, felizmente, ainda não compartilhamos a mesma agonia das palafitas, trapiches, farrapos. Tomá-las como referência é quase uma obrigação porque será uma furada esperar que alguma solução virá do mar ou das antenas de TV, muito menos de uma eleição presidencial. Porra nenhuma! Ela virá da nossa mobilização. É ai que está o nó da questão, e para aí que devemos apontar nossa fé. Não temos alternativa se não for constranger e desconstruir a ordem vigente. Por isso precisamos, ainda, de muitas greves gerais.


 [1]
Para uma confirmação dessa avaliação basta acessar as páginas das centrais sindicais e suas respectivas publicações pré e pós greve. Disponível em CUT <http://www.cut.org.br/>; Força Sindical < http://www.fsindical.org.br/ &gt;; UGT <http://www.ugt.org.br/>; CSP Conlutas <http://cspconlutas.org.br/> - Acesso em 03/06/2017.

[2]
Em 1986, o grupo musical Paralamas do Sucesso fez sucesso com a música “Alagados”, de autoria dos então componentes  Bi Ribeiro, João Barone e Herbert Vianna, A letra é uma critica sobre as condições de vidas nas favelas do mundo e cita como mote a situação das comunidades de Alagados (Salvador – Bahia), Favela da Maré (cidade do Rio de Janeiro) e Trenchtown (Cidade das Trincheiras) uma comunidade pobre de Kingston (Jamaica) onde teria nascido Bob Marley. A música é empolgante – Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=r6esToXGQJM> - Acesso em 03/06/2017

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